quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Como são construídos os quadros de recomendação de fertilizantes com base na análise de solo?

No Brasil existem basicamente dois tipos de adubação, quanto ao seu objetivo, a de correção e a de manutenção. A adubação de correção é geralmente recomendada quando se tem solos com teores baixos de nutrientes. Sua finalidade é, como o próprio nome diz, corrigir os teores para níveis adequados ou bons. Esse tipo de adubação é recomendado para nutrientes que não são facilmente perdidos por lixiviação, volatilização, evaporação e desnitrificação, ou seja, o fósforo.

Outra modalidade é a adubação de manutenção. Ela é utilizada para suprir a quantidade demandada pela soma do que é utilizado pela cultura, lixiviado, volatilizado ou perdido de outra forma. A adubação de correção também pode ser realizada ao longo dos cultivos através de aplicações que excedem as necessidades e as perdas. Isso é possível para casos em que as limitações de crescimento pelos baixos níveis do elemento no solo são pequenas. Fatores como o tipo de fertilizante, a concentração do nutriente nele, sua granulometria, solubilidade, os atributos do solo, os teores do elemento no solo, a cultura de interesse, o rendimento esperado e a relação entre o preço do fertilizante e da produção são alguns fatores dentre os vários que ajudam a definir quanto de fertilizante deve ser utilizado. Entretanto, no Brasil a forma mais comum de se recomendar a adubação é com base em tabelas ou quadros simplificados de recomendação de fertilizantes. Para isso, geralmente utiliza-se o resultado da análise de solo e a produção esperada.

Como são construídos esses quadros?

             Os valores obtidos com uma análise de solo isoladamente não tem significado algum com relação à necessidade de adubação. A concentração dos nutrientes obtida pelos extratores não é, verdadeiramente, a disponível às plantas. Se o número obtido com a utilização do extrator fosse o que está disponível, qual seria a explicação para as mudanças nesse número com a alteração do extrator?

Os dados obtidos pela análise de solo devem, primariamente, apresentar correlação com a característica que se espera aumentar ou melhorar na planta. O processo de construção dos quadros de recomendação, então, envolve resumidamente três etapas: a seleção de métodos de análise, a calibração desses métodos e a recomendação de adubação.

            A seleção de métodos é uma fase primária e envolve a seleção do método por um estudo de correlação entre o teor de nutriente no solo e na planta. Este estudo é geralmente realizado em casa de vegetação. São coletados solos com vários teores do nutriente estudado a fim de representar a amplitude de teores desse nutriente nos solos da região de interesse. O método escolhido deve ter elevado coeficiente de correlação. Além disso, é importante avaliar a sua executabilidade e o seu custo O método que extrai mais do elemento, também é preferível embora a correlação e a executabilidade sejam critérios de seleção mais importantes.

            Depois de selecionado o método deve passar por uma etapa de calibração. Nessa etapa os experimentos são realizados no campo. Os solos são amostrados antes do inicio do experimento e devem representar a amplitude da região de interesse. Os teores no solo devem permitir a obtenção de uma curva de resposta que é construída através da regressão entre a produção e esses teores. Caso isso não seja possível, devido a homogeneidade de teores ou solos na região, deve-se construir a amplitude de teores antecipadamente utilizando fertilizantes. Depois, a cultura de interesse é implantada e manejada de forma que outros fatores que possam afetar a produção sejam controlados ou conhecidos. O experimento é conduzido por vários anos, para que se saiba a influência de outros fatores como o efeito residual. A curva de resposta deve conter a máxima produção possível para a cultura naquela região.

            Com a utilização da curva de resposta é possível se obter níveis de fertilidade com base na produção relativa. A produção relativa é resultado da razão entre a produção obtida com determinado teor no solo e a produção máxima. No Brasil é comum a utilização desse método para a calibração de métodos de análise de solo.

            Com o aumento do teor no solo ocorre um aumento da produção que por sua vez é menor quanto maior o teor inicial. Por exemplo, um determinado solo está com uma concentração de fósforo de 0,1 mg kg-1. Ao aumentar essa concentração em 1 mg kg-1 a produção relativa aumenta de 15 % para 60 %. Se aplicarmos ao mesmo solo fertilizante suficiente para elevar o teor, que agora é de 1,1 mg kg-1, a 2,1 mg kg-1, a produção relativa passaria de 60 % para 70 %. Ou seja, no primeiro caso o teor no solo era menor, assim como a produção relativa, com isso um aumento de 1 mg kg-1 nos dois casos proporcionou um aumento mais significativo no que tinha teor menor. Com isso, solos que apresentam deficiência de determinado nutriente possuem uma possibilidade de resposta maior se comparados a solos que possuem teores médios ou adequados. Isso ocorre porque a curva de resposta geralmente assume forma logarítmica (Figura 1).
 Figura 1. Modelo de gráfico com definição dos níveis de fertilidade pela produção relativa.

            Com base nisso, são estabelecidos os níveis de fertilidade (muito baixo, baixo, médio, alto e muito alto, por exemplo). O primeiro limite estabelecido, geralmente é o nível crítico ou nível de suficiência. O nível critico corresponde ao teor no solo em que a produção relativa não sofre mudanças significativas com o aumento do mesmo. No gráfico, é o valor no eixo x (teor no solo) em que o valor de y (produção relativa) torna-se quase constante com uma variação do próprio valor de x. Geralmente, está entre 75 e 95 % de produção relativa.

Os outros níveis de fertilidade podem ser estabelecidos da mesma forma. Por exemplo, o ponto onde a resposta passa de alta a média pode definir o teor no solo que é o limite entre os níveis baixo e médio. Outra forma mais simplista é definir com base em amplitudes de produção relativa. Por exemplo, menor que 15% muito baixo, entre 15 e 30% baixo, entre 30 e 60% médio, entre 60 e 90% alto e maior do que 90% muito alto.

Depois da calibração são feitos experimentos para relacionar as doses aplicadas do nutriente à produção relativa resultante na planta, para cada nível de fertilidade. Com isso, pode ser utilizado o cálculo da dose de máxima eficiência econômica para definir a quantidade de fertilizante para cada nível de fertilidade. A partir daí podem ser construídas as tabelas ou quadros de interpretação de análise de solo e recomendação de fertilizantes, já que se têm para cada nível de fertilidade a dose a ser aplicada.

Existem muitas críticas a serem feitas a respeito desta metodologia de elaboração das tabelas, embora ainda seja a mais utilizada no Brasil atualmente. Os três principais aspectos que podem ser fonte de erro são:

1) A recomendação é feita como se a produção dependesse somente do teor do nutriente no solo, isso não é verdade.

2) A produção máxima pode não ser obtida em algumas condições o que subestima a dose necessária para todos os níveis de fertilidade.

3) Como se sabe o preço dos fertilizantes pode sofrer grandes alterações em pequenos períodos de tempo, com isso a recomendação com base na produção relativa pode não ser eficiente.

4 comentários:

  1. Cara muito bom seus artigos, tenho seguido o blog!
    Continue o bom trabalho.
    Abraço.

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  2. Obrigado Dudo. A participação de vocês que me mantem animado a escrever. Se tiver críticas pode comentar que o objetivo é realmente interagir. Abraço.

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  3. Muito bom mesmo. Seu método de escrever é esclarecedor. Parabéns!

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